Vida Nova nas Grotas permite estratégias de segurança e torna comunidades ambientes defensáveis em AL

Revitalização de áreas de difícil acesso na capital garante atuação policial; tema também foi base de estudo desenvolvido por PMs

Policiamento em parque linear em grota de Maceió
Foto: Igor Lessa / Ascom PMAL

Estima-se que Maceió possui 100 áreas de grota, onde vive um quarto da população da capital. São comunidades em situação de vulnerabilidade instaladas em trechos de terreno acidentado e de difícil acesso. O cenário costuma ser um desafio à presença policial. Cerca de 33% delas estão sob a abrangência do 13º Batalhão da Polícia Militar de Alagoas (13º BPM/PM-AL), sediado no bairro do Jacintinho.

Uma delas é a Grota da Jardineira, com mais de 400 moradias e dois mil moradores. Desde abril deste ano, a segurança passou por mudanças significativas devido a diversos motivos. “Até pouco tempo as vias eram no barro. Hoje, com tudo pavimentado na Jardineira, as guarnições fazem o patrulhamento e atendimento de ocorrências, estando presentes em locais onde era quase impossível acessar”, relatou o capitão Everton Estevan, subcomandante do 13º BPM.As obras de mobilidade e urbanização no local receberam investimento de aproximadamente R$ 4,5 milhões do tesouro estadual.

É engano pensar que infraestrutura urbana e segurança não caminham juntas. Violência, crime e desordem são fenômenos complexos e interconectados com impacto direto na sociedade. O design urbano, também conhecido como desenho urbano, pode ter um impacto significativo no controle da criminalidade.

A urbanização eficaz pode aumentar a segurança de uma área, enquanto um planejamento inadequado pode criar condições favoráveis ao crime. Esta é a temática abordada no Capítulo 4 do livro Superando Desafios na Segurança Pública: a Inovação como Ferramenta de Transformação em Alagoas. Intitulado Os fenômenos violência, crime e desordem através da estratégia multidisciplinar de ambiente defensável, o artigo científico é de autoria das soldados Vanessa Melo e Larissa Artemis em conjunto com o tenente-coronel Raumário Jerônimo e a sargento Thais de Lima.

INTERVENÇÕES EM ÁREAS VULNERÁVEIS

“O crescimento desordenado das cidades causa grandes problemas estruturais, geralmente resultando em obstáculos para a Segurança Pública, problemas esses que não conseguem ter um bom desempenho na resolução quando trabalhados apenas de forma repressiva. Alagoas tem buscado inovar na abordagem de Segurança Pública, pois entende a dinâmica criminal evolui a cada dia”, esclareceu uma das autoras a sargento da PM-AL Thais de Lima e que, assim como Vanessa, integra atualmente a equipe da Chefia Especial de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública (SSP).

As comunidades do Gelo, das Piabas, da Rodoviária, Pau D’arco e Divaldo Franco estão entre as beneficiadas pelo Programa Vida Nova nas Grotas. Embora não estejam no texto, estes exemplos ilustram o tema desenvolvido pelos autores. Lançado em 2016 e ampliado em 2017 pela ONU-Habitat, o programa é uma plataforma abrangente que converge todas as secretarias de Estado de Alagoas, visando melhorar a acessibilidade, mobilidade urbana, inclusão social, desenvolvimento econômico, saúde, educação, entre outras áreas. Até o momento, o Vida Nova nas Grotas já beneficiou 71 comunidades da capital.

Um grande referencial é o Parque do Cigano, localizado no principal acesso à grota de mesmo nome, o equipamento público deu nova cara à comunidade estimada em cerca de 40 mil pessoas. Uma área de intersecção entre os bairros Jacintinho e Mangabeiras, antes sem função social, transformou-se no primeiro Parque Linear da capital alagoana: são duas quadras poliesportivas, um campo de futebol, uma quadra de areia, academia ao ar livre, pista para caminhada, basquete ao ar livre, bicicletário, mesas para jogos de tabuleiro, playground e espaços de convivência.

“A área do 13º BPM cobre uma região historicamente vulnerável e carente, áreas de grota, de difícil acesso, com sérios problemas estruturais. A chegada em muitos trechos sempre foi difícil para a própria população e também para as guarnições. A presença do estado era dificultada. Existia, por exemplo, o risco de quedas. Isso foi modificado conforme foram construídas estruturas levando dignidade para quem vive nessas áreas, sobretudo as mais internas. Uma das consequências, sem dúvida, acaba sendo a presença maior do estado e isso acaba, consequentemente, beneficiando a execução do policiamento “, completou o capitão Estevan.

SEGURANÇA PÚBLICA E AMBIENTE DEFENSÁVEL

Constitucionalmente, a Segurança Pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos. Conforme o artigo 144 da Constituição Federal, as polícias militares fazem parte do rol de órgãos que a exercem. Sua razão de ser consiste em preservar a ordem pública e a incolumidade das pessoas e do patrimônio.Já a Estratégia Multidisciplinar de Ambiente Defensável busca prevenir e reduzir a violência, o crime e a desordem, além de diminuir a sensação de insegurança em ambientes públicos e privados. A abordagem integra medidas preventivas e reativas, otimizando a resposta a eventos violentos e melhorando a gestão da segurança.

Essa Estratégia requer a colaboração entre órgãos públicos e a sociedade, abrangendo outras áreas como, arquitetura, engenharia e gestão de riscos. Ela visa promover uma cultura coletiva de segurança e eficiência na aplicação dos recursos, sendo aplicável a diversos cenários além da esfera da Segurança Pública.

Desordem, crime e violência são fenômenos inter-relacionados. Por isso, a proposta lançada no texto visa promover a criação de ambientes que dificultam a prática de crimes e incentivam a presença e atuação do Estado, contribuindo para a gestão da criminalidade e melhorando a sensação de segurança e a qualidade de vida da população.

A Criminologia Ambiental está inserida dentro da ciência da Criminologia e tem seus conceito definido como: um campo de estudo dentro da criminologia que foca na relação entre ambiente físico e social e a ocorrência de crimes. Esse ramo da criminologia explora como características dos ambientes urbanos e rurais, como a estrutura física, o design urbano, e as condições socioeconômicas, influenciam a probabilidade de ocorrência de atividades criminosas.

INTEGRAÇÃO E AÇÕES MULTIDISCIPLINARES

A cultura de Ambiente Defensável baseia-se em dois pilares principais: a colaboração entre agências públicas e privadas e a participação ativa da comunidade. Esses pilares fortalecem várias áreas da Segurança Pública. A estratégia do Ambiente Defensável, já testada e com resultados positivos em diversas instituições, inclui exemplos como o projeto de urbanização na comunidade Chico Mendes, em Florianópolis/SC, pelo programa Habitar Brasil, e o programa Certidão Casas Seguras na Holanda. Portanto, a estratégia pode ser extremamente valiosa para a Segurança Pública em Alagoas, desde que seja aplicada de maneira estruturada e planejada, respeitando as peculiaridades locais.

A proposta visa promover a uma mudança conceitual nas instituições responsáveis pela aplicação da lei, incentivando-as a considerar opções inovadoras como ferramentas valiosas para melhorar a gestão da violência, crime e desordem. Reconhecendo que esses fenômenos são gerados pela sociedade e demandam soluções abrangentes, a proposta destaca a necessidade de integrar múltiplas disciplinas e agências para uma abordagem eficaz.

GRUPO DE TRABALHO

O Programa Vida Nova nas Grotas, do Governo de Alagoas, tem se destacado pelo sucesso na redução da violência em comunidades periféricas de Maceió. Em julho de 2023, a Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP) iniciou uma avaliação para mensurar o impacto das intervenções, contando com a colaboração da Secretaria de Transporte e Desenvolvimento Urbano (Setrand) e do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos (ONU Habitat).

O objetivo principal do grupo de trabalho é fortalecer o diálogo entre instituições e aprimorar políticas públicas para promover melhorias futuras nessas regiões, com foco na inclusão territorial e na redução das desigualdades socioeconômicas.

A avaliação inclui a análise comparativa dos índices criminais antes e depois das intervenções, visando otimizar a atuação da Segurança Pública em parceria com as comunidades. O Núcleo de Estatística e Análise Criminal (Neac/SSP) está encarregado da coleta de dados detalhados. Além disso, o grupo está identificando correlações entre problemas sociais e propondo projetos que contribuam para a diminuição da criminalidade.

Agência Alagoas